Carlos Maltz - Divulgação |
Fanatic Media Group: Em que momento você decidiu deixar a banda e por quais motivos exatamente?
Carlos Maltz: Eu fiquei na banda até a gravação do Simples de Coração. A gente foi pra Los Angeles mas ali a gente já não era mais uma banda, eu já falei isso outras vezes, a gente era um bando. Era um bando de gente cada um atirando para o seu lado. Depois dali já não tinha mais condição de a gente continuar sendo uma banda, já não era mais... Na minha maneira de ver, Simples de Coração já não era mais uma banda que gravou, é um excelente disco, tem um som incrível, músicas fantásticas, mas quem gravou foi um bando, não foi uma banda.
FMG: Você ainda lembra como foi o momento que apresentou O Castelo Dos Destinos Cruzados para o Humberto? Qual foi a reação dele na época?
CM: Quando apareceu O Castelo Dos Destinos Cruzados já não tinha mais clima nenhum entre nós, porque qualquer música, se eu tivesse apresentado Yesterday para o Humberto ele teria achado uma merda também... Então isso aí é muito mais o momento do que a música em si.
FMG: A banda teve um ritmo de trabalho intenso que levou ao desgaste da relação entre vocês. Umas férias com intervalo maior entre os discos nunca foi cogitado?
CM: Não tinha muito esse negócio de férias, estava sempre tocando, sempre acontecendo alguma coisa. Aliás na minha vida há muito essa palavra “férias” é uma palavra esperando tradução.
FMG: Como foi voltar a trabalhar com o Humberto depois de tantos anos? Nos shows você ainda se sente parte da banda ou apenas um convidado especial?
CM: Eu o Humberto, a gente começou a fazer umas coisas juntos e tal... Fizemos até músicas juntos, que é uma coisa que a gente não tinha feito na época da banda. Fizemos E-Stória juntos, fizemos Segunda-Feira Blues e gravamos algumas coisas: tem Depois De Nós, a gravação dele ficou excelente, enfim... Conseguimos nos aproximar mais até do que a gente era próximos na época da banda, depois que eu saí... Mas eu não sinto que eu seja parte da banda até porque não é mais a banda, é o trabalho dele. Talvez um dia a gente volte para conseguir ser uma banda, talvez até mais do que a gente foi naquela época, quem sabe...
FMG: Este ano o Humberto está em turnê comemorando os 30 anos do A Revolta dos Dândis. A longevidade deste álbum te surpreendeu? Como você vê este álbum hoje?
CM: A Revolta dos Dândis é o disco que eu mais gosto da banda, para mim é o grande disco dos Engenheiros, o mais criativo, enfim, mais original, mais individual... E lógico que na época não imaginava que isso ia ter a dimensão que isso alcançou, isso eu não poderia imaginar na época. Mas me parece justo que esse disco seja um disco antológico do rock brasileiro porque ele realmente é muito bom.
FMG: Conte-nos sobre a formação da Irmandade e como foi virar cantor e frontman depois de tantos anos atrás de uma bateria.
CM: Na época que eu saí da banda eu estava com essas viagens de compor e de cantar, de fazer música e tal... Eu fiz essa banda Irmandade Interplanetária, depois eu vi que isso não tinha nada a ver, não é pra mim isso aí. Isso aí é uma vocação, não é só porque você está ali no palco que você pode ocupar qualquer posição na banda. Um frontman é uma vocação que algumas pessoas têm, não é o meu caso, mas eu precisei passar por isso para poder chegar a essa conclusão.
FMG: Como foi o trabalho de composição e a responsabilidade na época de escrever as letras e ser o “patrão” da banda?
CM: Essa pergunta de ser o patrão da banda é uma pergunta boa também, porque eu acho que serviu pra eu ver o seguinte: que quando o patrão é outro a gente acha que o patrão é um fascista, é um terrorista, sei lá o quê... Quando a gente se torna o patrão, a gente vê o quanto que a gente é capaz de ser mais fascista, mais terrorista do que aquele que a gente achava nosso opressor. Então pra mim serviu pra isso, ser o patrão serviu para eu ver o quanto eu poderia ser mais opressor do que aquele que eu achava que me oprimia.
FMG: Que fatores na época levaram a não continuidade do grupo?
CM: O Irmandade Interplanetária acabou basicamente porque eu vim morar em Brasília e a galera morava no Rio... Então ficou inviável a gente continuar, mas é uma coisa eu já estava entrando em outra fase da minha vida, outro momento, já estava com a minha atenção voltada para outros assuntos.
Engenheiros Acervo |
FMG: Como a Astrologia e a Psicologia surgiram em sua vida?
CM: Os estudos de Astrologia e Psicologia, que da minha maneira de ver são praticamente a mesma coisa, da maneira que eu trabalho com Astrologia, eu não a uso para adivinhar o futuro. Eu a uso como uma ferramenta de autoconhecimento. Eu sempre usei assim, eu sempre fui uma pessoa interessada nisso - em autoconhecimento - conhecer a mim mesmo. E isso com o passar do tempo começou a se tornar minha profissão, nem tanto que eu quisesse ser profissional disso, mas era a única coisa que eu sabia fazer além de tocar bateria e eu não pretendia tocar bateria com outras pessoas que não fossem a minha banda. Então eu acabei me tornando profissional disso, esses meus estudos de autoconhecimento me levaram a ser um profissional também para auxiliar outras pessoas a se conhecerem. Então sempre foi essa busca busca de conhecer a mim mesmo, esse que é o meu interesse.
FMG: Você quando se mudou para Brasília e começou a estudar Psicologia e a trabalhar com Astrologia imaginava ter encerrado sua carreira musical?
CM: Olha, esse negócio de carreira musical... Essa palavra “carreira” eu não uso essa palavra, eu não estou interessado em fazer carreira em coisa nenhuma, nunca estive... Nunca pensei que minha carreira começou, terminou, chegou no auge, depois foi para não sei onde... Eu sempre fui tocando minha vida, fazendo as coisas que estavam ao meu alcance para sobreviver, então eu nunca pensei que minha carreira nem começou, nem decolou, nem terminou, nem nada disso aí.
FMG: Como surgiram as letras que vieram a ser o álbum Farinha do Mesmo Saco?
CM: As letras que eu comecei a escrever, O Castelo De Destinos Cruzados foi a primeira. Eu fiz, achei bom, comecei a fazer mais outras também e depois eu achei que era melhor escrever livro (risos)... Eu escrevia letras de músicas que eram um verdadeiro tratado filosófico, eu pensei: “- Rapaz, acho que é mais adequado um cara que nem eu tentar escrever livro do que letras de música...” Isso aí também é uma coisa que a pessoa tem que ter um dom, então, coisas que hoje eu sei que eu não tenho, mas que na época eu achava que eu tinha.
FMG: O álbum conta com a participação do Humberto e do Zé Ramalho. Conte-nos como se deu estas participações e como foi estar novamente em um estúdio com o Humberto, mas como líder da banda?
CM: O Zé Ramalho, eu sempre fui fã dele... Mandei uma carta para ele uma vez, peguei umas coisas que estavam, alguns pedaços da letra de Vila Do Sossego e escrevi umas coisas em cima, ele gostou... Quando apareceu a oportunidade de fazer o disco eu convidei, ele topou, gravou, super simples... Não teve nenhum tipo de dificuldade, fácil, pessoa fácil, gravou lá tranquilo... E Humberto, também convidei e prontamente ele aceitou. E esses negócios como foi gravar sendo o líder da banda, nunca pensei nisso não... E diante de uma pessoa com o talento do Zé Ramalho, do Humberto, tem essa de “eu sou o líder, você não sei o quê”, uma coisa é quem tem um pouquinho de talento, que acho que é meu caso para a música, mas já tem talento o bastante pra reconhecer quem tem, e a gente coloca cada pessoa no seu devido lugar, então não tem nada de ser líder e dizer pra não sei quem como é que tem q fazer... Tem isso aí não, para mim o líder da banda é aquele que Deus deu mais talento para a música, então sempre q eu estou com alguém que tem mais talento que eu, o líder é ele, não sou eu (risos)... Então é dessa maneira q eu penso.
FMG: Quais são as inspirações para as suas letras?
CM: Inspiração, sei lá de onde é que vem... Inspiração não é, não vem daqui ou dali, inspiração é um estado de ser, é a gente poder ver alguma coisa que está acontecendo e poder conectar aquilo com algo maior do que isso que está acontecendo. E aí a inspiração de a gente poder ver onde é que está o maior, o eterno na nossa vida... Então a inspiração, ela pode vir de qualquer lugar. No meu caso, eu sou uma pessoa que olha para as coisas que estão acontecendo no mundo, a inspiração pra mim vem daí, das coisas que estão acontecendo no mundo.
FMG: Ainda há planos de um novo álbum? Você tem dois livros escritos, como surgiu esta veia de escritor?
CM: Eu estou sempre escrevendo, fazendo alguma coisa, tocando, enfim... Qualquer hora dessas vou gravar algo novo, escrevo um livro, sei lá, não fico pensando muito nisso, mas provavelmente fico sempre fazendo [algo].
FMG: Seu novo livro, O Último Rei do Rock, conta a história de um astro de rock decadente. No seu tempo de estrada você viu muitos Juans que serviram de inspiração?
CM: O Juan Leno Montonero Kempes, o personagem dO Último Rei do Rock, de certo modo eu acho que ele é, e existem muitos Juans... Eu sou sou um, talvez tenha sido um, mas eu acho que ele é um símbolo, não só de gente do rock, mas de alguma coisa que está acontecendo nessa época, que é a celebridade instantânea. Então acho que essa é a essência do Juan Leno, a questão da celebridade instantânea vamos dizer assim, mais do que até a questão do rock em si. Eu acho que ele é um símbolo disso.
FMG: O livro vem acompanhado de um novo single, fale-nos sobre a ideia de lançá-lo como promoção do novo livro. Há a ideia de um novo álbum?
CM: O pessoal da editora me pediu, se eu tinha material antigo, alguma coisa dos Engenheiros do Hawaii para a gente usar de brinde na promoção do livro dO Último Rei do Rock. Mas eu não tenho nada disso porque essas coisas eu passei para frente depois que eu saí da banda, dei tudo para os fãs, essas relíquias dos Engenheiros eu passei tudo pra frente, não sobrou nada aqui, a não ser eu (risos)... E então eu falei com eles: “-Olha, coisa velha não tem, mas eu posso fazer uma coisa nova, gravar um single novo e tal…” os caras acharam ótima a idéia e daí veio essa [música] Lanterna na Proa.
FMG: O single Lanterna na Proa tem alguma relação com o tema do livro ou mesmo o personagem?
CM: O Lanterna na Proa não tem nada a ver com o livro. A não ser o fato de que ela foi gravada para ser o single de promoção do livro, que era a música que eu tinha pra gravar. Não tem uma relação direta com o livro ou o personagem.
FMG: Como você vê o Rock feito hoje em dia no mundo e em especial no Brasil? Tem alguma banda que você ouve ou acredita que é o futuro do Rock?
CM: Olha, eu não escuto muito o que está sendo feito hoje na música, no rock... É mais por falta de tempo mesmo porque tem um monte de coisa para fazer, para ler, para estudar... Das bandas que têm por aí, gosto muito do Muse, acho que é uma banda que os caras são muito bons músicos, isso é importante, eles tem um um direcionamento estético muito bem definido, eles sabem o que eles estão fazendo e eles conseguem juntar a linguagem antiga e trazer de uma forma nova, que chega a ser bastante original, é uma banda que eu tiro o chapéu. O Muse pra mim é uma das grandes bandas que está por aí agora.
FMG: Para terminar, que mensagem você daria para os seus fãs e para aqueles que ainda sonham com a formação clássica GLM?
CM: Bom, então pra fechar, dizer para os fãs que a gente está atravessando um momento muito difícil. Isso não é só aqui no Brasil, isso é no mundo inteiro, porque nós estamos entrando num período novo. Nós estamos numa transição de Eras, e as pessoas até algumas pessoas dizem sim, mas sempre é uma transição. Sim, nós sempre estamos vivendo numa transição de uma coisa pra outra, mas nós estamos realmente, do ponto de vista astrológico, nós estamos entrando numa Era nova, num período novo e sempre é conturbadíssima a entrada. As pessoas imaginavam que a chegada da Era de Aquário, especialmente nos anos 60, que seria um paraíso na Terra mas isso tudo é bobagem, não tem nada disso aí... A chegada de um novo período significa caos, significa destruição da ordem anterior e as pessoas ficam muito desorientadas porque os próprios valores que guiavam a humanidade até pouco tempo atrás foram todos questionados e não se colocou nada no lugar. Então nós vivemos hoje um momento muito confuso, muito perturbador, muito assustador inclusive, e as pessoas até me perguntam porque eu fiquei conservador e tal... Mas, olha, numa época em que está tudo caindo aos pedaços sobra pouca coisa para você ser além de conservador, que é ser progressista numa época em que a civilização está descendo pelo ralo. Então eu digo para as pessoas, olha, procurem em outro lugar, o novo não está naquilo que a gente já conhece, o novo não está naquilo que era novo na década de 60. É um momento assustador sim, perturbador, mas procurem o novo onde não está aquilo que você já conhece, aí é que está o novo. O novo pode ser aquilo que você menos espera.
E também dizer que, olha, eu acho que nunca a gente, eu pelo menos nunca estive, tão próximo de querer voltar a tocar com os Engenheiros. É uma coisa que eu gostaria ainda, se a gente pudesse juntar os três e fazer uma turnê bacana mesmo, com som parecido com o que a gente fazia na época, mas renovado... Mas eu acho q não tem cabimento a gente ficar fazendo uma coisa de “museu” de nós mesmos, mas pegar aquele som, aquela qualidade que tinha na época e trazer para os dias de hoje uma turnê bem feita mesmo, bem tocada dos Engenheiros. Eu nunca tive tanta vontade de fazer isso quanto eu tenho hoje, acho que essa seria uma bela resposta dos Engenheiros do Hawaii ao que está acontecendo aí. Essa seria uma bela resposta nossa para todas essas pessoas que esperam alguma coisa de nós. Eu mesmo não presto muita atenção em posicionamento político de artista, artista geralmente quando se mete a falar de política, essas coisas, fala um monte de bobagem emocional. Eu acho que o artista tem a dizer com a arte, então fazer uma turnê bem feita, bem tocada mesmo, eu nunca tive tanta vontade de fazer isso quanto eu tenho hoje. Isso aí gente, até mais!
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